Continuando o debate sobre tecnologias, mais um email do Pedro Ivo. Só para esclarecer, o Pedro Ivo é Comunicador Social formado pela UFG e Mestrando em Informação, Comunicação e Novos Media lá em Portugal.
“Eu defendo uma revolução tecnológica no sentido da linguagem sim, porque entendo que a existencia em sí da tecnologia, causa impactos culturais fortíssimos diretos e indiretos para a linguagem.
Ok ícaro… a lingua inglesa é “quadrada” e por isso se encaixa bem nessa maneira comum de pensar a tecnologia, mas é justamente essa lingua que exclui as pessoas na compreenção aprofundada das tecnologias que ela mesma cria. Quando as primeiras linguagens de programação surgiram, eles nao adotaram os comandos em inglês porque “É uma língua extremamente simples, que utiliza menos caracteres (sem acento ou Ç), a sintaxe é mais simples, e tem menos ambiguidade, especialmente com palavras soltas”, mas sim simplesmente porque quem desenvolveu as linguagens e os primeiros padrões de acesso para as tecnologias computacionais eram norte-americanos. se tivesse sido os chineses, as linguagens hoje estariam todas com comandos escritos em chinês e também seria considerada como uma maneira de “padronizar” a tecnologia. Todas as linguas são simples o suficiente.
Mas o que os norte-americanos fizeram fez sentido na época como algo democratizador, porque aquela tecnologia havia sido desenvolvida apenas para os países de lingua inglesa (o problema é que as outras linguas adotaram… basta lembrar as lutas oméricas dos programadores com o código UTF ou UNICODE). Ao meu ver, funciona como uma espécie de “democracia tecnológica à grécia antiga”: todos podem compreender as linguagens adotadas pelas tecnologias? Sim! desde que aqueles que tentam compreender sejam “cidadãos tecnológicos”. Mas para serem “cidadãos tecnológicos”, têm de compreender o inglês, têm que pertencer a uma cultura onde aquela tecnologia faz sentido de existência como algo necessário, tem de ter um determinado nível de instrução e por aí vai… e quantas pessoas possuem esses pré-requisitos? sempre foram poucas. A tecnologia por sí, em níveis de linguagem sempre foi excludente. Ela é assim desde o início. E se fosse outra lingua que nao o ingles, também seria excludente.
As tecnologias da comunicação e informação em sí representam fielmente as potencialidades de trabalho de uma determinada cultura ou costume.
Exemplo: a própria existencia do computador mantém uma lógica cultural linguística totalmente específica para o contexto de trabalho nos grandes escritórios norte-americanos nos anos 80. Uma prova disso é o modelo de “desktop” para a interface gráfica dos sistemas operacionais, que tentam imitar a mesa de trabalho de um escritório: coisas organizadamente colocadas em cima de uma “mesa” com os arquivos indexados em “pastas” e etc. Isso pra mim também é uma prova de excludencia, nao por este modelo ser padrão, mas sim pelo fato de nao caberem outros modelos. Outras formas de se usar a mesma “mesa”. A questão é que nem todas as outras culturas e linguagens têm de ser obrigadas a compreender as suas “mesas” ou “desktops” da maneira padrão. A padronização nao vem para unificar, mas sim para impor formatos que um mercado precisa dominar para se expandir: Padronizar ajuda na venda.
Ou seja, o desktop se tornou um padrão, não porque é a melhor forma de se organizar as coisas, mas sim porque dentro de um contexto de trabalho específico de uma cultura, aquilo fazia sentido (mas o mercado para facilitar as coisas, impõe uma padronização).
Mas essa discussão é tão complexa… ao mesmo tempo que veio a padronização imposta pelo mercado, eles enxergaram depois de algum tempo que adaptar a tecnologia a outras línguas também era muito rentável… e isso inclusive serviu de desculpa para eles mais uma vez transformarem tecnologias idênticas, em tecnologias “idênticas”, mas com diferenciais “exclusivos”: “a marca X se preocupa com os seus clientes porque faz traduções daquilo que produz”.
Finalizando: acho que seria, pelo menos interessante pensar na tecnologia como uma necessidade cultural (o que já acontece), mas também como uma necessidade linguística não padronizada, caótica e diversa o suficiente para nao caberem padrões. Confesso que isso nao seria nenhum pouco rentável e daria uma bagunça danada na forma de programar… mas mesmo assim acho uma experiência muito válida.”